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Fluxo de migrantes da Venezuela em busca de ajuda no Brasil dobra após eleição contestada de Maduro
Por Silvio Cassiano - SiCa
Publicado em 23/08/2025 08:40
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O fluxo de migrantes da Venezuela na fronteira com o Brasil aumentou muito depois das eleições municipais no país vizinho, realizadas em julho. Na cidade de Pacaraima, em Roraima, a média diária de atendimentos pela Cáritas Brasileira, organização social que dá apoio aos migrantes, já é a maior desde maio de 2024, quando a unidade foi instalada na região.

 

️ As eleições municipais na Venezuela deram vitória expressiva ao partido de Nicolás Maduro. O PSUV conquistou 285 das 335 prefeituras, incluindo 23 das 24 capitais, segundo a agência internacional AFP.

 

O g1 esteve na fronteira e registrou longas fila para a regularização migratória, com novas pessoas chegando a todo momento. Todos os recém-chegados tinham em comum a falta de esperança em relação à política na Venezuela e a esperança de um futuro melhor no Brasil (leia mais abaixo os relatos).

 

A estrutura sanitária Padre Edy, da Cáritas, oferece gratuitamente banheiros, duchas, fraldários, lavanderia e bebedouro com água potável. A média de atendimentos a recém-chegados, que era de 150 por dia no primeiro semestre, subiu para 350 em agosto. Isso representa mais que o dobro de atendimentos a novos migrantes.

 

Considerando os migrantes novos e os que já estão no Brasil, a Cáritas realizou 17.212 atendimentos até o dia 20, quase 6 mil a mais que em todo o mês de julho (11.236). Foi um salto de 400 migrantes por dia para 860 por dia, em menos de um mês.

 

“Notamos que, após as eleições, o fluxo cresceu ainda mais. Muitos relatam falta de esperança em mudanças políticas, já que o governo de Maduro se manteve. Eles acreditam que no Brasil terão uma vida melhor”, disse a coordenadora da Cáritas em Pacaraima, Luz Tremaria.

O espaço fica ao lado do posto de regularização migratória, administrado pela Operação Acolhida, força-tarefa liderada pelo Exército que atua com apoio de organizações sociais, como a Cáritas.

 

Em contato com o g1, o governo brasileiro informou, por meio da Casa Civil, que a Operação Acolhida tem protocolos específicos para "caso de emergências de aumento relevante e súbito na entrada de migrantes e refugiados".

 

 

A migração venezuelana para o Brasil, iniciada em 2015, transformou Roraima na principal porta de entrada desse fluxo, motivado pela crise econômica, política e social na Venezuela. Desde então, mais de 1 milhão de pessoas cruzaram a fronteira, e mais da metade permanece no país, atraída pela política brasileira de acolhimento e interiorização.

 

Ainda não foram divulgados dados oficiais da entrada de venezuelanos em julho e agosto. Segundo o governo brasileiro, o país recebeu 96.199 venezuelanos no primeiro semestre deste ano, tendo entrado por Roraima 53% deles, o equivalente a 51.697 pessoas. O número representa um aumento de 5% em relação ao mesmo período do ano passado, quando foram registrados 92.027 migrantes.

 

Além da Padre Edy, a Cáritas também administra outras três instalações sanitárias: outra em Pacaraima e duas em Boa Vista. Todas registraram aumento em agosto. "O crescimento do fluxo após o último processo eleitoral da Venezuela não parece ser algo temporário. Isso nos pegou de surpresa", resume Wellthon Leal, assessor nacional da Cáritas.

 

 

 

 

O eletricista Moises Mata, de 29 anos, de El Tigre, contou que resistiu a sair da Venezuela porque tinha emprego. No entanto, a demissão o fez decidir pelo Brasil. Ele chegou no dia 17 de agosto e pretende ir para Santa Catarina, onde parentes vivem há 2 anos.

 

"Perdi o trabalho e não vi mais futuro. A taxa de desemprego está muito alta. Depois das eleições, ficou claro que nada vai mudar. Não vejo esperança política no meu país", disse.

 

A dona de casa Dexys Sapienza, 40 anos, de San Felix, atravessou a fronteira com as duas filhas adolescentes e concorda que a situação ficou insustentável. "Tiveram as eleições municipais, estamos tão revoltados que nem fomos votar", disse.

 

“Agora tudo é em dólar, e o valor sobe duas vezes por dia. Ficou impossível manter a família. O governo segue o mesmo, e nós sem esperança. Quero que minhas filhas concluam os estudos aqui [no Brasil] e tenham oportunidades que não teriam lá”, afirmou Dexys.

O pedreiro Edgar Suarez, 56 anos, também de San Felix, afirmou que pensava em migrar havia dois anos, mas só conseguiu com a ajuda de parentes que vivem em Santa Catarina.

 

“Na Venezuela, só dava para sobreviver ‘matando tigres’ [dando um jeito], fazendo bicos de um ou dois dias. As eleições mostraram que nada vai mudar. O principal para mim agora é ter emprego e uma casa no Brasil”.

 

 

 

 

Entre os que chegam também há idosos, como Alex Rodriguez, 70 anos, de Puerto La Cruz. Ele deixou o país em busca de tratamento de saúde e para viver com a filha em Santa Catarina.

 

"Tenho catarata e na Venezuela não cuidam disso. Preciso da ajuda da minha família e quero me tratar aqui. Minha filha me fala que no Brasil a vida é melhor. Para mim, qualidade de vida é conseguir a cirurgia e ficar com os meus", disse Rodriguez.

 

Migrantes com perfil familiar

O pesquisador e diretor do Centro de Ciências Humanas da Universidade Federal de Roraima (UFRR), João Carlos Jarochinski Silva, que acompanha a migração venezuelana desde o início, avalia que, no geral, independentemente do resultado recente das eleições, "a desesperança faz parte do cenário da última década."

 

 

Além disso, para ele, assim como os migrantes ouvidos pelo g1, o perfil atual de venezuelanos que deixam o país é o de pessoas que possuem algum parente no Brasil. Esse contexto ocorre porque quem chegou antes consegue ser um ponto de apoio.

 

"Com o tempo, pessoas que conseguiram se estabelecer começaram a promover o processo de reunião familiar. Isso não significa que toda a família migrou de uma vez. Muitas vezes, jovens adultos vieram primeiro, e, com melhores condições de trabalho e renda, trouxeram filhos, netos e até pais", explicou o pesquisador.

 

Após entrar por Roraima, muitos migrantes seguem para outros estados em busca de emprego e melhores condições de vida, enquanto parte permanece em abrigos ou em situação de rua. A Operação Acolhida, liderada pelo governo federal e apoiada por agências internacionais, tornou-se peça central nesse processo humanitário.

 

“A gente pensava que o país ia mudar, mas não mudou. Tem comida, mas não há dinheiro para comprar. Depois das eleições, vi que não havia saída. Não quero voltar nunca mais. Amo o Brasil”, disse o segurança Luiz Perez, 28 anos, recém-chegado de Caracas.

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