Com a fala interrompida por soluços constantes, sem usar máscara, o presidente Jair Bolsonaro fez discurso em evento sobre o grafeno em Caxias do Sul, na Serra Gaúcha, nesta sexta-feira (9), retomando uma das pautas que eram recorrentes em seus discursos antes mesmo da eleição de 2018.
Bolsonaro ainda criticou governos anteriores, sem citar nomes, e voltou a falar sobre “eleições limpas”.
“As pressões que eu enfrento, fiquem tranquilos. O meu couro é grosso. Fizemos um ministério invejável. Quando alguns falam em eleições, eu quero que analisem os ministros que eu indiquei, enfrentando pressões e os ministros que os antecederam. Não tinha como o Brasil dar certo no passado.”
“Hoje, nós sonhamos com isso, temos a certeza que podemos mudar o Brasil. O que eu mais prego, o que eu mais quero são eleições limpas, para que possamos garantir a vontade popular”.
Os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Luís Roberto Barroso, reagiram às recentes ameaças golpistas der Bolsonaro ao processo eleitoral e democrático do país.
Ambos se manifestaram nesta sexta-feira horas após Bolsonaro ter afirmado, sem apresentar nenhuma prova, que a fraude eleitoral está no TSE, além de ter atacado Barroso, a quem chamou de “idiota” e “imbecil”. Um dia antes, Bolsonaro já havia colocado em xeque a realização das eleições de 2022.
Bolsonaro tem feito repetidas ameaças contra as eleições, numa radicalização de discurso que coincide com pesquisas que apontam o aumento de sua reprovação e o favoritismo do ex-presidente Lula (PT) no pleito de 2022.
Ao lado de Marcos Pontes, ministro de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Bolsonaro participou da abertura da Primeira Feira Brasileira do Grafeno e fez a inauguração oficial da UCSGRAPHENE, planta de produção de grafeno da UCS (Universidade de Caxias do Sul).
Pontes apresentou vários produtos produzidos com grafeno ao presidente, expostos no local. Bolsonaro estava acompanhado pelo senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) e pelo ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Onyx Lorenzoni (DEM), entre outras figuras políticas.
Nem o presidente, nem a maioria dos ministros e deputados da comitiva usavam máscara, apesar da vigência da medida obrigatória devido a pandemia do novo coronavírus. Na chegada ao aeroporto local, Bolsonaro também voltou a pegar uma criança no colo, sem estar com o acessório.
Segundo a UCS, a unidade é a primeira de produção em escala industrial instalada por uma universidade ou centro de pesquisa na América Latina e a maior em capacidade de produção. ??A unidade comporta uma produção anual de até 500 quilos e tem capacidade de expansão para 5.000 quilos por ano.
Ela entrou em operação em março do ano passado, cerca de 15 anos depois do início das pesquisas com nanomateriais na universidade da Serra Gaúcha.
Atualmente, entre os projetos já em atividade, há mais de 100 acordos de confidencialidade assinados.
A Taurus, empresa sediada em São Leopoldo, na região metropolitana de Porto Alegre, uma das principais fabricantes mundiais de revólveres e pistolas, firmou acordo com a universidade no fim de junho para realizar pesquisas e desenvolver armamentos com grafeno.
O CEO Salesio Nuhs entregou a Bolsonaro um troféu com um protótipo de uma pistola G3, que utiliza grafeno na composição de algumas peças, e está em pesquisa junto à UCS, e um capacete de grafeno para ele usar na motociata prevista para ocorrer neste sábado em Porto Alegre.
Um milhão de vezes menor do que um fio de cabelo, o grafeno é composto por uma camada de átomos de carbono interligados por estruturas hexagonais e foi descoberto em 2004, na Inglaterra. Feito a partir do grafite, é o composto mais fino e mais forte conhecido pela humanidade.
Em um vídeo publicado em janeiro de 2017 em sua página no Facebook, Bolsonaro, então deputado federal, aparece mostrando afloramento de grafite na região do Vale do Ribeira (SP).
Bolsonaro afirmava que cada quilo do mineral teria custo de US$ 1 no mercado internacional, mas dele poderiam ser extraídos até 150 gramas de grafeno por quilo, que chegariam a custar US$ 15 mil.
No mesmo vídeo, ele ataca a demarcação de terras indígenas na região, dizendo que haveria jazidas minerais.
“Agora, toda essa área riquíssima em grafeno está sendo requerida para a Funai para que seja uma reserva indígena. É a velha máxima, não existe terra rica, que não exista também ali uma reserva indígena ou que esteja na iminência de ser demarcada uma reserva indígena”, afirma Bolsonaro na gravação.
Nesta sexta, durante o discurso, o presidente disse que sempre foi apaixonado por ciências exatas, sabia a tabela periódica de memória e que descobriu o grafeno em uma viagem a Miracatu (SP), onde visitou uma montanha de grafite.
Segundo ele, pessoas do local contaram que “gente que não falava a nossa língua foi perfurar o terreno”. Bolsonaro afirmou ainda que a curiosidade aflorou mais ainda em sua cabeça nos anos que antecederam as eleições.
“Fiz vídeos, comecei a falar do nióbio e do grafeno. A ignorância por parte de alguns, que a gente perdoa, até falavam que eu devia escolher para vice-presidente o nióbio ou o grafeno. Obviamente, isso não vinha de pessoas apenas ignorantes, vinha de pessoas que não queriam que o Brasil se projetasse nisso, que agora, mais ainda, nós tomamos conhecimento que é o futuro da nossa pátria”, disse ele.
“Não é fácil evoluirmos em ciência e em tecnologia, geralmente tem alguém na nossa frente. Agora, uma grande fresta apareceu, um grande horizonte, uma fronteira incomensurável. Ao passar por aqui, vi na prática que realmente há algo fantástico para nossa pátria”, seguiu o presidente.
A agenda de Bolsonaro no Rio Grande do Sul inclui ainda compromissos em Bento Gonçalves, também na Serra, nesta sexta. No sábado, ele segue para Porto Alegre, onde participa de uma motociata, passeata com motociclistas, e tem agenda com o prefeito Sebastião Melo (MDB).
O presidente não tem nenhum evento previsto com o governador Eduardo Leite (PSDB). Na semana passada, Bolsonaro chamou a decisão de Leite de falar abertamente sobre ser gay de “cartão de visitas” para sua candidatura e disse que não teria nada contra, mas “querer impor seu costume, seu comportamento para os outros, não”.
O governador respondeu ao comentário, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, dizendo que “o presidente é um imbecil”.