Um policial militar estrangulou Beatriz de Moura Silva de Oliveira, dona de uma padaria em Itajaí, no interior de Santa Catarina. Apesar do caso ter acontecido em 2019, o vídeo foi divulgado The Intercept nesta segunda-feira (22).
A comerciante chegou no estabelecimento juntamente com a filha, de 13 anos, e encontrou um homem imobilizado e algemado no chão da porta da panificadora. Este, chamado Jadson José da Silva, foi preso em flagrante com cinco envelopes de cocaína pelos policiais Adair de Oliveira e Khaique Ferreira da Silva.
Uma câmera acopladas à roupa do policial flagrou toda ação. Haviam quatro meses que o equipamento fazia parte da rotina dos policiais que atuam na linha de frente em Santa Catarina.
O The Intercept conta que os agentes mantiveram Jadson na frente da padaria por alguns minutos enquanto encerravam a ocorrência. Beatriz conversou com os policiais e disse que eles estavam atrapalhando a entrada dos clientes. A conversa ainda era normal até Beatriz tentar explicar seu ponto de vista.
Antes dela falar, Adair sobe o tom de voz e fala: “acha ruim o trabalho da polícia, senhora?”. Ela responde que não está achando ruim e pede para ele não colocar palavras na boca dela e o que deveria ser um diálogo normal rapidamente se transforma em uma cena de horror.
Enquanto Beatriz e Adair discutiam, o PM Khaique entrou na padaria e foi para trás do balcão, onde estava o marido de Beatriz, Antonio Cesar de Oliveira, que administra a padaria com ela. O policial pediu os documentos do comerciante aos gritos e começou a puxá-lo.
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“Você tem que ter autorização para entrar aqui”, disse Beatriz. O marido logo apontou para uma funcionária e disse para ela ligar para a polícia. Foi quando o policial Khaique imobilizou o comerciante pelas costas e o arrastou para fora da padaria. Antônio ficou sem reação. Beatriz tentou impedir e lembrou que ambos são trabalhadores.
No boletim de ocorrência que registraram mais tarde naquele dia, os PMs relataram que Antônio “investiu com socos contra o policial Khaique Ferreira”, o que não aparece na imagem da câmera policial. Meses depois, em maio, em depoimento à Corregedoria da PM no inquérito que apura a conduta dos dois soldados, o policial diz apenas que houve “luta corporal” entre ele e o comerciante.
Ainda conforme o vídep, enquanto o marido era levado para fora da padaria, Beatriz ficou irritada com a situação que acontecia no estabelecimento e deu alguns tapas no soldado. Em seguida, policial a empurrou com a mão no pescoço. Ela reagiu afastando a mão de Adair. Logo em seguida, ele empurrou a mulher e passou a segurá-la pelos cabelos. Durante a ação, a trabalhadora ficou com o rosto voltado para o chão. A mulher foi imobilizada, e o policial deu voz de prisão para ela.
Mesmo sem reação, o policial não cessa as agressões. “Põe o braço para trás, eu vou te apagar”, diz o PM. A câmera mostra Beatriz com o rosto inchado, por causa da falta de ar. Após conter a soltar a trabalhadora, o policial joga spray de pimento no rosto da mulher.
Uma terceira pessoa, uma funcionária da padaria que presenciou a cena, estava grávida na época e disse que se aproximou de uma policial para pedir calma e ele espirrou spray de pimenta na direção dela. No vídeo também é possível ver a filha do casal tentando acalmar a mãe para o pior não acontecer. Logo, o soldado fala “deixa eu trabalhar, guria!”.
Atenção cenas fortes!
Mesmo com a gravação e os depoimentos contraditórios dos policiais, a corregedoria da Polícia Militar entendeu que a ação foi correta. No inquérito nº 410/IPM produzido pelo capitão Rafael Marcon e aprovado pelo tenente-coronel Alfredo Von Knoblauch. O comando da PM de Itajaí considerou que os policiais Adair e Khaique aplicaram o “uso progressivo da força”, que não houve “indícios de crime” ou “transgressão disciplinar”.
“A despeito das gravações da câmera serem fortes, tendo em vista ter sido realizado o uso progressivo da força, entendemos que foram necessárias para fazer cessar as agressões perpetradas por Beatriz, bem como para evitar uma tragédia tendo em vista a mesma ter se agarrado no armamento do policial militar”, diz o texto.
Os policiais, que agrediram as vítimas, estão trabalhando no atendimento de ocorrências por telefone no Centro de Operações Policiais Militares de Itajaí. Já Beatriz e Antônio continuam respondendo ao processo aberto na 2ª Vara Criminal de Itajaí por desacato e resistência.
Em fevereiro de 2021, o casal entrou com uma ação contra o estado de Santa Catarina por danos morais e responsabilidade da Administração Pública no valor de R$ 35 mil. Em 25 de fevereiro, dia do último despacho, a Justiça solicitou cópia do vídeo e intimou as partes envolvidas para saber se há interesse em realizar audiência, em razão da pandemia, por videoconferência.
Por mensagem, Beatriz disse ao The Intercept que já contou a sua história à Corregedoria da PM e que dois advogados acompanham o caso. O Mais Goiás tentou entrar em contato com a assessoria da Polícia Militar de Santa Catarina, mas a reportagem não foi atendida. Entretanto, por e-mail, o Comando da Polícia Militar respondeu ao The Intercept que o caso está “devidamente finalizado no âmbito institucional, agora transcorre na esfera judiciária”. Sobre os afastamentos, a PM disse que eles “não foram afastados pois não tem nenhum prejuízo processual sobre os mesmos”.