
ADPF 973, apresentada por partidos de esquerda e movimentos negros, fala de ativismo judicial e uso da tese de “estado de coisas inconstitucional”
O Supremo Tribunal Federal (STF) incluiu na pauta desta quarta-feira (26) a análise de uma ação que pode obrigar instituições públicas e privadas a adotarem uma série de medidas de enfrentamento ao chamado “racismo estrutural”.
A ADPF 973 foi apresentada por sete partidos de esquerda, com orientação da Coalizão Negra por Direitos, e pede que União, estados e municípios elaborem e implementem um plano nacional voltado ao combate a práticas consideradas racistas em diversas áreas da administração pública.
A ação integra um conjunto de iniciativas de movimentos negros que buscam, por via judicial, impor obrigações aos Três Poderes em temas como ampliação de cotas raciais, incentivo à participação política de pessoas negras, proteção a religiões de matriz africana e outras políticas afirmativas.
Na Câmara, também segue em debate a criação de um fundo bilionário para financiar medidas inspiradas na mesma lógica.
A ADPF 973 se apoia na tese do “estado de coisas inconstitucional”, que autoriza o Judiciário a impor medidas concretas ao Executivo e ao Legislativo diante de violações estruturais de direitos fundamentais.
A advogada e especialista em responsabilidade civil Kátia Magalhães
A advogada e especialista em responsabilidade civil Kátia Magalhães. Foto: Governo do Estado do Ceará
A estratégia, no entanto, é alvo de críticas por expandir os limites do Judiciário. A advogada e especialista em responsabilidade civil Kátia Magalhães afirma que a tese não existe na Constituição nem na legislação brasileira e tem sido usada como instrumento de ativismo judicial. “O Judiciário se arroga o poder de declarar que há problemas estruturais que exigem sua intervenção contínua. Essa tese tornou-se uma ferramenta para o autoritarismo”, critica.
Magalhães explica que processos desse tipo não se encerram com o trânsito em julgado. Mesmo após a decisão, juízes continuam monitorando e determinando medidas por tempo indeterminado.
Ela cita como exemplos a ADPF das Favelas e a decisão do STF que declarou um “estado de coisas inconstitucional” no sistema prisional brasileiro. Para a advogada, obrigar governos a seguir diretrizes judiciais implica destinar recursos públicos sem previsão orçamentária: “Esses planos são formulados ao bel-prazer dos ministros, gerando custos fora do teto de gastos.”
Outro ponto debatido é o próprio conceito de “racismo estrutural”. O filósofo e colunista Paulo Cruz lembra que a teoria foi desenvolvida no Brasil por Silvio Almeida, ex-ministro de Direitos Humanos do governo Lula, e afirma que ela representa uma interpretação da realidade, não uma descrição objetiva. “É a partir dessa teoria, bastante criticada por sociólogos, que o Estado quer impor medidas como se fosse um diagnóstico factual. Algo completamente delirante”, diz.
Kátia Magalhães também cita uma recente decisão do Superior Tribunal de Justiça, que rejeitou por unanimidade a possibilidade de “racismo reverso”, ao arquivar uma ação contra um homem negro que insultou um italiano com expressão de cunho racial.
Para ela, o entendimento fere o princípio da isonomia previsto na Constituição, pois cria tratamentos distintos para situações semelhantes.
Cruz avalia que o avanço desse tipo de pauta no STF ocorre por pressão ideológica. “Os ministros acatam essas reivindicações não porque encontram fundamento técnico, mas porque isso rende boa reputação a eles. Esses grupos têm muito poder de pressão, e contrariá-los significaria comprar uma briga direta”, afirma.
