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O retorno da máscara: fumaça de queimadas traz de volta proteção do tempo da pandemia
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Publicado em 13/09/2024

Diante das queimadas da seca mais extensa registrada no Brasil, moradores de cidades mais afetadas pelas fumaças resgataram um item que era essencial durante pandemia de Covid-19: a máscara de proteção da boca e do nariz. Do Norte ao Sul, a proteção voltou às ruas, mesmo sem ter o uso obrigado pelas autoridades. Médicos e especialistas frisam a necessidade de proteção, especialmente para quem tem problemas respiratórios.

 

Em Porto Velho, a máscara começou a faltar nas farmácias, depois de a capital de Rondônia se tornar a cidade brasileira com a pior qualidade do ar, entre as que são acompanhadas pelo IQAir, empresa suíça que monitora os níveis de poluição da atmosfera.

 

— Tive dificuldade para encontrar. Andei por pelo menos quatro farmácias até encontrar máscara, e o preço aumentou bastante — afirma Ive Cabral, contadora e moradora de Porto Velho, que usa a proteção principalmente nas primeiras horas do dia e à noite, quando sai de casa. — São os piores horários de fumaça.

 

 

A publicitária Maria Luisa Medeiros procurou atendimento médico em Porto Velho três vezes por causa de bronquites e infecção na garganta, mesmo não tendo problemas respiratórios crônicos. Depois disso, passou a usar máscara quando anda na rua, o que sempre evita fazer e a faz interromper exercícios ao ar livre. Ela prefere se deslocar de carro. Em casa, o umidificador é imprescindível. Medeiros lamenta que não vê há um mês o céu “sempre azul” citado no hino de Rondônia, motivo de orgulho local.

 

— A gente não vê mais o céu, é só calor e fumaça — lamenta. — Nunca vivi isso. Todo ano tem seca e fumaça, mas esse ano está muito pior. O sol parece uma luz de led laranja. A lua, esquece. E estrela, não sei mais o que é. Nem o prédio da frente da minha casa eu vejo mais direito, já esqueci até a cor dele.

 

A publicitária conta que o público diminuiu no Espaço Alternativo de Porto Velho, avenida que é uma das principais opções de lazer da população, por fechar diariamente para uso exclusivo de pedestres.

 

— Está impraticável. Se eu andar na rua, boto máscara, mas acho que muita gente parou de usar por causa do calor intenso. É muito desconfortável, preferem nem sair de casa. É horrível, o cheiro de fumaça é constante — afirma a moradora, que diz acompanhar as recomendações de máscara pelos jornais. — No hospital, o médico falou que todo dia chega muita gente com tosse ou dor da garganta.

 

No escritório

Como Medeiros, Ive Cabral diz que a poluição neste ano é mais intensa. Ela chegou a usar máscara até dentro do escritório, nos piores dias.

 

— Essa não é a primeira vez que tem fumaça, então já usei máscara outros anos. Mas com certeza estou usando há mais tempo dessa vez. Já tive pneumonia, e as alergias sempre atacam nessa época.

 

Em Manaus, a Fiocruz Amazônia passou a recomendar o uso da máscara há um mês, o que foi seguido pelo epidemiologista Jesem Orellana. Ele conta que maioria da população não usa, mas é possível ver a proteção em ambientes abertos e no transporte coletivo.

 

— Já tive tuberculose e tenho rinite alérgica — diz Orellana, que destaca alguns efeitos da fumaça sobre a saúde, como tosse seca, sensação de falta de ar, irritação dos olhos e garganta, congestão nasal ou alergias na pele. — Indiretamente, o problema pode contribuir para o agravamento de doenças cardiovasculares e respiratórias.

 

No Pantanal, a máscara tornou-se essencial à brigadista voluntária Virginia Paes, que vive na comunidade ribeirinha da Área de Proteção Ambiental Baía Negra, em Ladário (MS).

 

— Comecei a usar por causa da fumaça e porque sinto muito cansaço. Estou exposta à fumaça a todo o momento, no sábado passado ajudei no combate a um incêndio.

 

Com os corredores de vento que vão do Norte ao Sul do país, não são apenas os municípios próximos das queimadas que sofrem com a fumaça. Nesta semana, Curitiba (PR) registrou seu pior índice de qualidade do ar desde 2008. A criadora de conteúdo Natália Nofke de Almeida começou a sentir falta de ar, dor de cabeça e garganta ressecada. E recorreu à máscara para andar na rua.

 

— É a primeira vez que uso por causa de poluição, nunca pensei que ia chegar nesse ponto — afirma Nofke. — As pessoas me olham com cara de espanto, não sei se é trauma da pandemia. Uma amiga que também estava com dificuldade de respirar começou a usar agora.

 

Diferença da pandemia

Perguntada sobre possibilidade de se determinar a obrigatoriedade da máscara, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, afirmou na quarta-feira que a situação é diferente da pandemia de Covid-19.

 

— Não está colocado o uso como algo obrigatório. Mas nossa recomendação é que se busque evitar a exposição por tempo prolongado e ficar o mais distante possível dos focos da queimada — afirmou a ministra, que também destacou a necessidade de se hidratar e de umidificar os ambientes.

 

Coordenadora do Laboratório de Química Atmosférica da PUC-Rio, Adriana Gioda defende o uso e explica que, além da tosse e cansaço, a alta exposição à fumaça pode desencadear asma e bronquite.

 

— O principal poluente emitido pelas queimadas é o material particulado PM2.5. Ele está relacionado a várias doenças, mas se manifesta em especial no sistema respiratório. Grupos de riscos são ainda mais afetados, e a recomendação é usar máscara. Principalmente a N95, que é mais eficaz em impedir a entrada de partículas PM2.5 no organismo — recomenda a especialista, que lembra que a concentração desse poluente, em Porto Velho, ficou até dez vezes acima do recomendado pela OMS.

 

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